NOSSA VIDA EM UMA MINICASA. A HISTÓRIA DA FAMÍLIA QUE TROCOU TUDO PARA MORAR NA PRIMEIRA TINY HOUSE DO BRASIL, COM 27 M²
Há alguns meses, Robson, Isabel e o pequeno João Pedro têm um novo lar: a Araraúna. Uma minicasa sobre rodas, pintada em vibrantes azul e amarelo, tal como a ave rara que representa a grandeza da fauna brasileira. Para o casal e seu filho, a moradia representa a busca por uma vida mais simples, próxima, sustentável e – assim esperam – feliz.
O espaço diminuto onde vivem tem nome importado: tiny house, movimento que surgiu nos Estados Unidos e já se espalhou por Canadá, Austrália, Nova Zelândia e toda Europa. Aqui no país, ganha estímulo com a homologação oficial da Araraúna, a primeira minicasa oficial do Brasil.
Para se ajustar a um lifestyle mínimo, no entanto, não basta reduzir espaço. “Tiny house vai além de ter uma casa pequenininha. É um estilo de vida”, explica Robson.
Reportagem de Fernanda Fadel. Publicada em 16 de março de 2020.
Caixinha de música
“Viver em uma tiny house é uma eterna dança”, diz Robson Lunardi, de 37 anos, enquanto divide o espaço da pia com a mulher, Isabel Albornoz, de 42. Ele lava copos enquanto ela corta limões para fazer uma água saborizada. “Quando estou na cozinha, calculo meus movimentos para não esbarrar na Bel. Temos que fechar os cotovelos e ter perfeita sincronia”, brinca.
A tiny house da família tem 8,20 metros de comprimento, 2,60 de largura e 4,40 de altura. Em 27m², estão sala, cozinha, dois quartos, escritório e banheiro. Ela foi construída em cima de um chassi com rodas, o que a coloca na categoria de minicasa móvel.
O movimento da família para a Araraúna, estacionada no terreno de um sítio em Porangaba, no interior de São Paulo, foi resultado de uma mudança radical de vida. “A tiny house pareceu a solução dos nossos problemas”, relembra Bel.
Do maxi ou mini
Junto há 10 anos, o casal vivia, em 2012, em uma casa convencional de pouco mais de 160 m² no Parque Continental, na Grande São Paulo, e assumira um financiamento de 40 anos.”Tínhamos aquela mentalidade de casar, ter filho, morar em uma grande casa para criar as crianças”, pontua a mãe de João Pedro, de 4 anos.
Robson trabalhava em um banco, onde alcançava promoções em curtos prazos de tempo. Isabel é turismóloga e atuava como gerente comercial de uma agência de intercâmbio, onde concentrava funções de metas e comissões.
Em abril de 2013, depois de uma crise de pânico, Bel foi diagnosticada com a Síndrome de Burnout, um distúrbio psíquico causado pela estafa do trabalho. Em agosto do mesmo ano, Robson correu para o hospital pensando estar sofrendo um AVC, porém, era um dos sinais de que estava sofrendo da mesma doença que a esposa.
Nos meses seguintes, o casal workaholic acumulou idas e vindas de licenças de afastamento dos trabalhos. “Foi quando descobri por acaso na internet um TED Talk sobre minimalismo”, relembra Robson. “Logo depois, assisti a um outro sobre as tiny houses“.
“Comecei a entender que muitas coisas que faziam parte da nossa vida eram fonte de estresse”
Apesar do espírito aventureiro, Bel não topou de bate pronto a ideia da moradia diminuta. “Sempre fui meio nômade e tinha o sonho de ter um motorhome para viajar o mundo”, conta. “Porém, quando Robson me mostrou uma tiny house pela primeira vez, disse que nunca iria morar em uma casa dessas”. Mas em pouco tempo ela amadureceu a ideia e embarcou com o marido nessa aventura. “Depois de mais pesquisas, vi que era a solução perfeita para a gente”, relembra.
Menos é mais
O Movimento Tiny House nasceu com o norte-americano Jay Shafer. Considerado o precursor das minicasas, ele construiu uma sobre rodas, de pouco mais de 8 m², em 1999. Na época, Shafer afirmou que a obra pequenina era o resultado de ter tirado todas as partes desnecessárias de uma casa.
Essa ideia está intimamente ligada ao minimalismo, hoje bastante propagada pela dupla Joshua Fields Millburn & Ryan Nicodemus. No documentário “Minimalismo: um documentário sobre as coisas importantes”, eles mostram como mudaram de estilo de vida para chegar a uma vivência mais significativa: livrando-se de bens materiais em excesso, abandonando profissões estressantes, pensando em sustentabilidade e dedicando mais tempo para as relações pessoais.
Uma das técnicas que os seguidores do minimalismo usam é a chamada Packing Party (algo como “Festa do Empacotamento”, em tradução literal). Difundida por Millburn e Ryan Nicodemus, também autores do blog The [Minimalists], a “brincadeira” ajuda na hora de se livrar das tralhas.
A ideia é simples: você guarda tudo (mas tudo mesmo) em caixas e só desempacota os itens à medida que sentir necessidade de usá-los. Depois de um período de um mês ou pouco mais, as peças que continuarem nas caixas são vendidas ou doadas porque são consideradas desnecessárias.
O grande salto (ao pequeno)
No final de 2013, Robson e Bel largaram seus empregos, venderam a casa em São Paulo e partiram para os Estados Unidos para conhecer cara a cara as tiny houses. “A gente precisava ver de perto para ter certeza”, pontua Isabel. “Não dava para executar no escuro esse projeto que ia mudar nossas vidas”, completa Robson.
O casal participou de workshops, visitou fábricas e acompanhou a rotina de famílias que decidiram abraçar a vida em uma minicasa – com todo desapego que o lifestyle minimalista exige.
“Ficamos ainda mais apaixonados, foi uma experiência fantástica descobrir esse estilo de vida”
Durante essa experiência, eles decidiram criar o portal Pés Descalços, com direito a um canal no YouTube, onde compartilharam passo a passo da construção da Araraúna.
Um dos primeiros vídeos postados é sobre a estreia em uma tiny house. Ao chegar na minicasa estacionada no quintal de uma casa em Tampa, nos EUA, Robson sentiu uma “leve agonia” e Isabel “uma disparadinha no coração” ao ver o tamanho diminuto da moradia. A primeira impressão logo foi revertida ao abrir a porta: “Foi uma sensação de conforto e aconchego maior do que em uma casa grande”, diz ele.
Fase do desapego
O casal voltou ao Brasil decidido a tirar do papel o projeto da Araraúna. E pensaram grande: junto com um amigo construtor, fundaram a Tiny Houses Brasil, a primeira fábrica de minicasas do país, em um barracão nos fundos do sítio em Porangaba.
Robson, Isabel e o pequeno João Pedro vivem neste terreno há 2 anos. Até a obra ficar pronta, em agosto de 2019, o trio morou na casa do caseiro. Foi a fase de transição para uma vida minimalista, criando uma rotina no campo.
Uma das etapas mais importantes foi o “destralhe”: reduzir o acúmulo adquirido por décadas para apenas poucos pertences. Na mudança para a casinha no sítio, muita coisa ganhou novos donos. “Saíram dois caminhões abarrotados para doação”, relembra Robson.
“Com a consciência que criamos, era quase como um insulto ter tudo aquilo em casa. Sentimos um baita alívio com o desapego”
Soluções para um microespaço
Foto: Mayra Azzi/UOL
Escada-armário
Os degraus da escada servem para guardar as roupas da família. Nas mais baixas e de fácil acesso, estão as roupas do filho, João Pedro.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Escada-banco
Milimetricamente encaixada e com dupla função: compõe os primeiros degraus para a escada que leva aos quartos e serve de banco para sentar-se na área da cozinha.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Mesa escondida
Ela fica “secreta” no móvel da cozinha, que pode ser movimentado e levado até o sofá, por exemplo, para apoiar eletrônicos ou livros e na hora das refeições.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Tábua de passar retrátil
Ela dobrável e fica escondida em uma gaveta no mesmo móvel da mesa escondida.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Sofá modular
Composto por seis módulos de madeira funciona como assento. Os quadrados podem ser movidos na hora de receber visitas ou praticar ioga, por exemplo.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Para sentar e guardar
Os módulos do sofá também servem de compartimento para guardar objetos e calçados.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Pés em outro nível
No quarto do casal, uma solução simples para resolver a falta de espaço para se sentar no nível superior da minicasa: um buraco transforma o chão em assento.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Aproveitamento das janelas
As nove janelas da minicasa não são por acaso. Elas iluminam o ambiente do nascer ao pôr do sol. Solução sustentável que reduz a necessidade de eletricidade.
Foto: Mayra Azzi/UOL
Banheiro seco
A privada funciona sem água: o xixi vai para um galão e é descartado e o cocô vai para uma caixa e é utilizado como matéria de compostagem.
Vida em comunidade
O primeiro projeto da empresa Tiny Houses Brasil foi ganhar experiência dando asas à Araraúna. Os próximos desafios são construir a Toca Turquesa, a minicasa de um casal que vive em Campinas (SP), e, a longo prazo, popularizar as minicasas no país. “O brasileiro precisa primeiro ver, tocar e se dar conta que vale a pena viver assim, que não é só uma aventura”, diz Robson.
Outro item da lista de sonhos futuros é formar uma comunidade nos moldes da que conheceram nos Estados Unidos. Na cidade de Orlando Lakefront, os tiny housers dividem um grande terreno com mais de trinta minicasas e trailers, lago, lavanderia, horta comunitária e espaço para criar animais.
Enquanto isso, dentro das limítrofes paredes da casinha azul, Isabel revela outro sonho que está sendo acalentado na Araraúna. “Estamos na fila de adoção. Em breve, o João Pedro há de ganhar um irmãozinho”, almeja ela, enquanto mostra o tiny espaço vazio reservado em uma gaveta para o novo membro da minicasa.
Acesse aqui a matéria na integra no site da UOL.
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